domingo, 29 de abril de 2012

Reportagem do Jornal "O Estado de São Paulo" sobre Chico Picadinho

Caros colegas,

Vejam excelente reportagem sobre Francisco Costa Rocha, mais conhecido como "Chico Picadinho". 70 anos de idade, 43 deles atrás das grades

http://www.estadao.com.br/noticias/suplementos,chico-aos-pedacos,866564,0.htm

Abraços,
Prof. Gustavo Coelho

A delação premiada e a resolução do crime

A Lei nº 8.072/90, dispõe no seu parágrafo único do artigo 8º que "o participante que denunciar à autoridade o bando e a quadrilha, possibilitando seu desmantelamento, terá a pena reduzida de 1 (um) a 2/3 (dois terços). A doutrina e jurisprudência sempre se debateram sobre a parte final do artigo: A delação deve ter o condão de tornar possível o desfazimento da organização criminosa? 
A discussão parece superada com recente julgado do STJ (HC 174.286-DF). Com efeito, a Sexta Turma decidiu no dia 10 de abril de 2012, que a delação premiada deve trazer "informações eficazes, capazes de contribuir para a resolução do crime"
Segundo o Min. Sebastião Reis Júnior, se não há "auxílio efetivo na investigação e na elucidação do evento delituoso, inaplicável à espécie a benesse da delação premiada".
Abraços, amigos. Até o simulado!
Prof. Gustavo Coelho

quinta-feira, 26 de abril de 2012

O crime de injúria e a internet

Dada a multiplicação do fenômeno internet, uma nova modalidade do crime de injúria surgiu: Aquela propalada em redes sociais, tais como, twitter, orkut e facebook. Em recente julgado (CC 121.431-SE, julgado em 14 de abril de 2012), o Superior Tribunal de Justiça definiu como competente para o processamento e julgamento desses crimes, a Justiça Estadual.
Muito embora, boa parte dessas redes sociais estejam armanezadas em páginas eletrônicas internacionais, o fato do crime ser cometido via internet, não autoriza supor ou atrair por si só a competência da Justiça Federal.
Abraços e até sábado.
Prof. Gustavo Coelho

Existe hipótese de controle de constitucionalidade judicial preventivo no Brasil?


Adentrando o espinhoso tema do controle de Constitucionalidade, devemos primeiramente elucidar algumas noções básicas, quais sejam:
Quanto à natureza do órgão, o controle pode ser judicial ou político (não-judicial). Exemplo de controle político pode ser encontrado na França, onde a tarefa da fiscalização cabe ao Conseil Constitutionnel. No Brasil predomina o controle jurisdicional, efetuado pelo poder judiciário.
Quanto ao momento do exercício, nos deparamos com o controle preventivo e o repressivo. Este se configura quando exercido após a vigência da norma. Aquele, efetuado antes da vigência da norma.
Por regra, o Brasil adota o controle judicial repressivo. Ou seja, os juízes e tribunais fiscalizam a conformidade da lei à constituição após a vigência destas.
 Não obstante, claro exemplo de controle político preventivo é o desenvolvido pelas Comissões de Constituição e Justiça do Congresso Nacional. Estas avaliam o projeto de lei emitindo parecer terminativo sobre a constitucionalidade do dispositivo.
Feita esta breve digressão, voltemos à pergunta: existe hipótese de controle JUDICIAL PREVENTIVO no direito brasileiro?
SIM! Suponha que o Congresso resolva deliberar projeto de emenda constitucional que vise retirar do empregado o direito de receber remuneração, no mínimo, 50% superior à normal por trabalhar horas extras (art. 7, XVI, CF). Indignado com tal projeto, o Ilmo. Deputado Federal Tiririca pode ajuizar, junto ao STF, Mandado de Segurança contra ato da mesa do Congresso que admitiu a DELIBERAÇÃO do projeto, posto que se trata de uma violação frontal ao artigo 60, §4º, IV, CF.

Abraços!
Prof. Berto Igor

terça-feira, 24 de abril de 2012

Mais mudanças no Código Penal

A comissão de juristas que elaboram o anteprojeto do novo Código Penal aprovou ontem proposta para tipificar a conduta de enriquecimento ilícito. Segundo o texto aprovado, o servidor público ou agente político que não comprovar a origem de determinados bens ou valores, poderá sofrer pena de até 05 anos de detenção.
A comissão entendeu que os bens móveis ou imóveis adquiridos sem comprovação por parte do servidor ou político, funcionará como meio de prova da prática delituosa. Entretanto, o crime de enriquecimento ilícito terá caráter subsidiário, somente se admitindo sua persecução criminal, nas hipóteses de impossibilidade ou falta de justa causa para a ação penal nos crimes de peculato e corrupção, por exemplo.
Desde logo, o tipo em questão sofre pesada crítica, mormente pelo fato de que inverterá o ônus da prova, ao obrigar o acusado a provar que a aquisição dos bens que compõem seu patrimônio tiveram lastro financeiro.
Estamos atentos!
Abraços e até sábado,
Prof. Gustavo Coelho

domingo, 22 de abril de 2012

HC 73.367-1-MG

Conforme prometido, eis o conhecido habeas corpus que sedimentou o entendimento jurisprudencial de que, muito embora, não há que se falar em vedação da reformatio in pejus no Tribunal do Júri, O JUIZ-PRESIDENTE NÃO PODE EXASPERAR A PENA, AGRAVANDO-A ALÉM DO QUE RESTOU ESTIPULADO NO PRIMEIRO JULGAMENTO."
Só lembrando: A inexistência da reformatio in pejus no Tribunal do Júri só se aplica ao Conselho de Sentença, porquanto seus veredictos são soberanos, o que autoriza os jurados no novo julgamento reconhecer uma qualificadora não ventilada no primeiro júri.
Abraços e bom domingo a todos!!
Prof. Gustavo Coelho

http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=74448

sábado, 21 de abril de 2012

O Novo Código Penal e o crime de furto

Caso seja aprovado o anteprojeto do Novo Código Penal, no crime de furto, a persecução criminal somente se iniciará com a representação do ofendido, de tal sorte que o delito em questão passará a ser de natureza pública condicionada. Ademais, a pena para o furto simples será reduzida de 06 meses a 3 anos, o que autorizará a suspensão condicional da pena para os réus primários.
Além da energia elétrica, o anteprojeto inclui ainda como objetos de furto: água, gás canalizado, sinal de TV a cabo e internet. Contudo, a reparação do dano até a sentença de 1º grau será causa de extinção da punibilidade.
Dessa forma, o Novo Código Penal, ao redefinir completamente o crime de furto se mostra atento às mais modernas dogmáticas do Direito Penal, notadamente a ideia de uma justiça restaurativa. Com efeito, essa redefinição afastará, de certo modo, o forte apelo patrimonialista presente no legislador de 1940.
Abraços e sucesso!
Prof. Gustavo Coelho

terça-feira, 17 de abril de 2012

Voto vencedor no julgamento do REsp 1.111.566-DF

Caros,
Eis o voto vencedor no julgamento do REsp 1.111.566-DF que definiu a impossibilidade de outros meios de prova para a aferição da embriaguez no volante. Em primeira mão, pois o voto ainda não foi publicado.
Abraços,
Prof. Gustavo Coelho

http://www.stj.jus.br/portal_stj/publicacao/download.wsp?tmp.arquivo=2480

domingo, 15 de abril de 2012

O Princípio da Soberania dos Veredictos e o Princípio da Ne Reformatio In Pejus

A Constituição da República assegura no seu artigo 5º, inciso XXXVIII, que nos julgamentos do Tribunal do Júri, os veredictos proferidos pelo Conselho de Sentença são soberanos. De outro turno, o artigo 617 do CPP determina que em se tratando de recurso exclusivo da defesa, a decisão do Tribunal, câmara ou turma não poderá agravar a pena imposta ao réu.
Eis a dúvida: Tendo alguém sido pronunciado por homicídio qualificado e condenado apenas em homicídio simples, recorrendo da decisão e sendo novamente julgado, poderão os jurados, no novo julgamento, condená-lo, reconhecendo a qualificadora?
O Supremo Tribunal Federal enfrentou a questão no HC 91.585-RJ e definiu: "Anulados o julgamento pelo tribunal do júri e a correspondente sentença condenatória, transitada em julgado para a acusação, não pode o acusado, na renovação do julgamento, vir a ser condenado a pena maior do que a imposta na sentença anulada, ainda que com base em circunstância não ventilada no julgamento anterior."
Logo conclui-se: O Princípio da Proibição da Reformatio in Pejus prevalece mesmo nos julgamentos do Tribunal do Júri.
Um bom domingo a todos,
Prof. Gustavo Coelho

quarta-feira, 11 de abril de 2012

Senado votará a legalização de prostíbulos

Já se encontra na pauta de votações do Senado Federal, um projeto de lei tendente a legalizar a existência de casas de prostíbulos. Com efeito, muito embora a prostituição não seja proibida, a existência de estabelecimentos que dela se aproveitam é crime tipificado no artigo 229 do Código Penal. A medida seria um primeiro passo para a regulamentação da prostituição no país, a exemplo do ocorre com países como Holanda, Espanha. 
Pela proposta, os trabalhadores que desejarem ingressar em casa de prostituição deverão, necessariamente, serem maiores de idade e agirem de forma livre e consciente. 
Nos vemos sábado,
Prof. Gustavo Coelho  

sábado, 7 de abril de 2012

As últimas estatísticas sobre a reincidência

Segundo dados do próprio CNJ, aproximadamente 80% do detentos tornam-se a reincidir. Na verdade, esse é o tipo de estatística que deve ser analisada ao reverso, ou seja, de cada 10 condenados, apenas 02 podem ser considerados aptos a reintegrar a sociedade.
De outro turno, a taxa de reincidência no grupo dos condenados a penas alternativas não ultrapasse 5%..
Segundo o Prof. Luiz Flávio Gomes, "Quem é tratado sem nenhum respeito à dignidade, tende a se comportar dessa forma quando passa a viver em sociedade. Quem trata os presos (ou qualquer outra pessoa, inclusive as vítimas dos crimes) como sub-gente está plantando mais violência."
Prof. Gustavo Coelho

sexta-feira, 6 de abril de 2012

STF julgará a possibilidade de aborto de feto anencéfalo

O Supremo Tribunal Federal julgará na próxima quarta-feira (11 de abril de 2012), a possibilidade legal de realização de aborto nas hipóteses em que o feto apresenta anomalia médica denominada anencefalia. A anencefalia é uma malformação congênita caracteriza pela ausência do encéfalo, tratando-se de uma patologia letal, o que caracteriza uma existência de vida muito curta.
O relator da ADPF nº 54, Min. Marco Aurélio, em outra oportunidade, já autorizou liminarmente a antecipação do parto para as gestantes que comprovassem, mediante laudo médico, a condição da anencefalia. Segundo o Ministro, "diante de uma deformação irreversível do feto, há de se lançar mão dos avanços médicos tecnológicos, postos a disposição da humanidade não para a simples inserção, no dia-a-dia, de sentimentos mórbidos, mas, justamente, para fazê-los cessar."
Estaremos atentos,
Abraços,
Prof. Gustavo Coelho

quinta-feira, 5 de abril de 2012

STJ divulga esclarecimento acerca da polêmica decisão acerca do estupro de vulnerável

Amigos, 
O STJ divulgou em seu site nota de esclarecimento à sociedade acerca do polêmico caso envolvendo a presunção relativa de violência nas hipóteses de estupro cometido contra menores de 14 anos.


NSTITUCIONAL
Esclarecimentos à sociedade
Em relação à decisão da Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, objeto da notícia “Presunção de violência contra menor de 14 anos em estupro é relativa”, esclarecemos que:

1. O STJ não institucionalizou a prostituição infantil.
A decisão não diz respeito à criminalização da prática de prostituição infantil, como prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente ou no Código Penal após 2009.

A decisão trata, de forma restrita e específica, da acusação de estupro ficto, em vista unicamente da ausência de violência real no ato.

A exploração sexual de crianças e adolescentes não foi discutida no caso submetido ao STJ, nem mesmo contra o réu na condição de "cliente". Também não se trata do tipo penal "estupro de vulnerável", que não existia à época dos fatos, assim como por cerca de 70 anos antes da mudança legislativa de 2009.

2. Não é verdade que o STJ negue que prostitutas possam ser estupradas.

A prática de estupro com violência real, contra vítima em qualquer condição, não foi discutida.

A decisão trata apenas da existência ou não, na lei, de violência imposta por ficção normativa, isto é, se a violência sempre deve ser presumida ou se há hipóteses em que menor de 14 anos possa praticar sexo sem que isso seja estupro.

3. A decisão do STJ não viola a Constituição Federal.

O STJ decidiu sobre a previsão infraconstitucional, do Código Penal, que teve vigência por cerca de 70 anos, e está sujeita a eventual revisão pelo STF. Até que o STF decida sobre a questão, presume-se que a decisão do STJ seja conforme o ordenamento constitucional. Entre os princípios constitucionais aplicados, estão o contraditório e a legalidade estrita.

Há precedentes do STF, sem força vinculante, mas que afirmam a relatividade da presunção de violência no estupro contra menores de 14 anos. Um dos precedentes data de 1996.

O próprio STJ tinha entendimentos anteriores contraditórios, e foi exatamente essa divisão da jurisprudência interna que levou a questão a ser decidida em embargos de divergência em recurso especial.

4. O STJ não incentiva a pedofilia.

As práticas de pedofilia, previstas em outras normas, não foram discutidas. A única questão submetida ao STJ foi o estupro - conjunção carnal mediante violência ou grave ameaça - sem ocorrência de violência real.

A decisão também não alcança práticas posteriores à mudança do Código Penal em 2009, que criou o crime de "estupro de vulnerável" e revogou o artigo interpretado pelo STJ nessa decisão.

5. O STJ não promove a impunidade.

Se houver violência ou grave ameaça, o réu deve ser punido. Se há exploração sexual, o réu deve ser punido. O STJ apenas permitiu que o acusado possa produzir prova de que a conjunção ocorreu com consentimento da suposta vítima.

6. O presidente do STJ não admitiu rever a decisão.

O presidente do STJ admitiu que o tribunal pode rever seu entendimento, não exatamente a decisão do caso concreto, como se em razão da má repercussão.

A hipótese, não tendo a decisão transitado em julgado, é normal e prevista no sistema. O recurso de embargos de declaração, já interposto contra decisão, porém, não se presta, em regra, à mudança de interpretação.

Nada impede, porém, que o STJ, no futuro, volte a interpretar a norma, e decida de modo diverso. É exatamente em vista dessa possível revisão de entendimentos que o posicionamento anterior, pelo caráter absoluto da presunção de violência, foi revisto.

7. O STJ não atenta contra a cidadania.

O STJ, em vista dos princípios de transparência que são essenciais à prática da cidadania esclarecida, divulgou, por si mesmo, a decisão, cumprindo seu dever estatal.

Tomada em dezembro de 2011, a decisão do STJ foi divulgada no dia seguinte à sua publicação oficial. Nenhum órgão do Executivo, Legislativo ou Ministério Público tomou conhecimento ou levou o caso a público antes da veiculação pelo STJ, por seus canais oficiais e de comunicação social.

A polêmica e a contrariedade à decisão fazem parte do processo democrático. Compete a cada Poder e instituição cumprir seu papel e tomar as medidas que, dentro de suas capacidades e possibilidades constitucionais e legais, considere adequadas.

O Tribunal da Cidadania, porém, não aceita as críticas que avançam para além do debate esclarecido sobre questões públicas, atacam, de forma leviana, a instituição, seus membros ou sua atuação jurisdicional, e apelam para sentimentos que, ainda que eventualmente majoritários entre a opinião pública, contrariem princípios jurídicos legítimos.

Boa semana a todos,
Prof. Gustavo Coelho

quarta-feira, 4 de abril de 2012

Portar arma desmuniciada constitui crime?

Em todos os seus julgamentos recentes, o STJ assentou o entendimento de que o porte de arma de fogo é crime de perigo abstrato, cuja consumação se verifica com o simples ato de alguém trazer consigo arma de fogo em desacordo com as disposições que regulam a matéria. Em verdade, o bem jurídico protegido pela norma é a incolumidade pública, bastando, pois, para sua configuração, a simples probabilidade de dano e não a sua ocorrência. 
Resta porém um última questão que muitos se perguntam: Portar arma desmuniciada é crime?
Em recente julgado (22 de março de 2012- HC 211.823-SP, ), o STJ lançou uma pá de cal sobre o tema, fixando o paradigma de que  mesmo a arma de fogo sem munição, configura a conduta típica prevista no Estatuto do Desarmamento. Com efeito, muito embora a ofensividade de portar arma ser balas seja mínima, ela possui um evidente caráter intimidativo, o que termina por levar a prática de condutas que atinjam terceiros e viole o aspecto preventivo do tipo penal.
A todos uma boa Semana Santa,
Prof. Gustavo Coelho

domingo, 1 de abril de 2012

A verdade real na jurisprudência do STJ


Pense em doxa, aletheia ou episteme e responda: é possível alcançar a verdade absoluta? A questão aflige filósofos desde a Antiguidade, mas o dilema é enfrentado cotidianamente pelos magistrados. Na doutrina, o debate gira em torno do princípio conhecido como da “verdade real”. E a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) retrata esses confrontos. 

Um voto que define bem o alcance do conceito é o do ministro Felix Fischer, atual vice-presidente do Tribunal, no Habeas Corpus 155.149. Nele consta a seguinte citação do jurista Jorge Figueiredo Dias: “A verdade material que se busca em processo penal não é o conhecimento ou apreensão absoluta de um acontecimento, que todos sabem escapar à capacidade do conhecimento humano.” 

Segundo o autor, essa verdade real deve ser lida como uma verdade subtraída das influências da acusação e da defesa. Também não se trata de uma verdade “absoluta” ou “ontológica”, mas “há de ser antes de tudo uma verdade judicial , prática e, sobretudo, não uma verdade obtida a todo preço, mas processualmente válida”. 

No mesmo voto, o ministro critica a concepção ortodoxa da verdade real, tida como mitificada pelos que seguem essa corrente. Ele cita Francisco das Neves Baptista: “O mundo da prova é o mundo das presunções e construções ideais, estranhas ao que se entende, ordinariamente, por realidade. E o sistema jurídico processual assim o quer.” 

Esclarece o relator: “O princípio da verdade real, para além da terminologia, não poderia ter – na concepção ortodoxa – limitações.” No entanto, pondera, “não pode acontecer é reconhecer-se, como homenagem à suposta verdade real, algo como provado, quando em verdade, em termos legais, tal demonstração inocorreu”. 

Relações jurídicas Em voto de 1992, o então ministro Vicente Cernicchiaro explica as razões dessa diferença de tratamento dada à verdade no processo penal: “O status de condenado, por imperativo da Constituição, é definido exclusivamente pelo Judiciário. Não há partes, pedido, nem lide, nos termos empregados no processo civil. Ao contrário, juridicamente, o sujeito ativo (estado) e o passivo (réu) não se colocam em posições opostas. Na verdade, conjugam esforços para esclarecimento da verdade. As partes, assim, têm a mesma e única preocupação: definir o fato narrado na imputação” (REsp 13.375). 

A decisão da esfera penal até mesmo prevalece sobre as ações cíveis ou administrativas. Apesar da independência dos campos jurídicos, quando se trata de autoria ou materialidade, a decisão penal deve ser observada pelos outros juízos. Diz o Código Civil, nessa linha: “Art. 935. A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal.” 

Assim decidiu o STJ no REsp 686.486: “A decisão na esfera criminal somente gera influência na jurisdição cível, impedindo a rediscussão do tema, quando tratar de aspectos comuns às duas jurisdições, ou seja, quando tratar da materialidade do fato ou da autoria.” 

Porém, ressalvou o ministro Luis Felipe Salomão no caso: “O reconhecimento da legítima defesa do vigilante no juízo criminal não implica, automaticamente, a impossibilidade de a parte autora requerer indenização pelos danos ocorridos, especialmente quando, como no caso ora em análise, pugna pelo reconhecimento da responsabilidade civil objetiva do banco e da empresa de vigilância, obrigados em face do risco da atividade”. 

O Código de Processo Penal repete a norma, invertendo a disposição: “Art. 66. Não obstante a sentença absolutória no juízo criminal, a ação civil poderá ser proposta quando não tiver sido, categoricamente, reconhecida a inexistência material do fato.” 

Nesse sentido, também já decidiu o STJ: “Não havendo sentença penal que declare a inexistência do fato ou a negativa de autoria, remanesce a independência das esferas penal, cível e administrativa, permitindo-se que a administração imponha ao servidor a pena de demissão, pois não há interferência daquelas premissas no âmbito da ação por improbidade administrativa.” (AREsp 17974). 

“É firme o entendimento doutrinário e jurisprudencial no sentido de que as esferas criminal e administrativa são independentes. Apenas há repercussão no processo administrativo quando a instância penal se manifesta pela inexistência material do fato ou pela negativa de sua autoria, o que não é o caso dos autos”, afirmou, por sua vez, o ministro Herman Benjamin no AREsp 7.110. 

E, novamente, o ministro Salomão esclarece: “Somente nos casos em que possa ser comprovada, na esfera criminal, a inexistência de materialidade ou da autoria do crime, tornando impossível a pretensão ressarcitória cível, será obrigatória a paralização da ação civil. Não sendo esta a hipótese dos autos, deve prosseguir a ação civil.” (Ag 1.402.602) 

O princípio da verdade real sustenta ainda outro, o pas de nulitté sans grief, segundo o qual não há nulidade sem prejuízo. É o que afirma o ministro Humberto Martins no Recurso Especial 1.201.317: “Não se declarará nulo nenhum ato processual quando este não causar prejuízo, nem houver influído na decisão da causa ou na apuração da verdade real.” 

Perito menor 
É o risco de violação ao princípio da verdade real que justifica a impossibilidade de peritos serem menores de 21 anos de idade. O entendimento é da Sexta Turma, que concedeu habeas corpus a condenado por roubo em cuja audiência a vítima, surda-muda, teve como intérprete a filha, de 12 anos. 

“A doutrina tende a justificar a proibição com a ideia de que o menor não teria amadurecimento suficiente para entender e expressar, na condição de intérprete, os fatos objetos da imputação. Dessa maneira, a sua atuação poderia comprometer o resultado da oitiva, o que contraria as bases da verdade real”, explicou a relatora, ministra Maria Thereza de Assis Moura. (REsp 259.725) 

Caso Mércia 
O princípio foi discutido também no caso da morte de Mércia Nakashima. A defesa do réu pretendia que o processo corresse em Nazaré Paulista (SP), onde ela teria morrido por afogamento. Isso porque o Código de Processo Penal (CPP) dispõe que a competência é do juízo do local onde o crime se consuma. 

Porém, o juiz de Guarulhos (SP) afirmou que a regra deveria ser afastada no caso concreto, em vista da dificuldade que o deslocamento de competência traria para a apuração da verdade real: das 16 testemunhas de defesa, 13 seriam ouvidas em Guarulhos; o caso teria causado comoção social nessa cidade; e, de modo geral, a produção de provas era mais favorecida pela manutenção do processo nessa comarca. 

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) seguiu na mesma linha. Para os desembargadores paulistas, a alteração da competência enfraqueceria a colheita de provas: “A comarca de Guarulhos é o local onde há maior facilidade para se apurar os elementos probatórios necessários à busca da verdade real”, afirmaram no acórdão. 

A decisão foi mantida pelo STJ no HC 196.458: “Ora, deve-se ter em mente que o motivo que levou o legislador a estabelecer como competente o local da consumação do delito foi, certamente, o de facilitar a apuração dos fatos e a produção de provas, bem como o de garantir que o processo possa atingir a sua finalidade primordial, qual seja, a busca da verdade real”, afirma o voto do relator, ministro Sebastião Reis Júnior. 

“Dessa forma, seguindo o princípio da busca da verdade real, tem-se que se torna mais segura a colheita de provas no juízo de Guarulhos”, acrescentou. “O desenrolar da ação penal neste juízo, sem dúvidas, melhor atenderá às finalidades do processo e melhor alcançará a verdade real”, concluiu o relator. 

HC da acusação Um assistente de acusação invocou o princípio para justificar o pedido de habeas corpus contra o réu. No HC 40.803, o assistente argumentava que a legislação deixou “grande lacuna” quanto a seu papel, cujos atos deveriam ser interpretados com “elasticidade, mormente quando imprescindíveis para a apuração da verdade real”. 

Por isso, o STJ deveria conceder o habeas corpus para fazer com que fossem ouvidas pelo júri as testemunhas apontadas pelo assistente de acusação, mas não arroladas pelo Ministério Público. Mas o pedido não foi conhecido pela Quinta Turma. 

Daniel Dantas

No julgamento do habeas corpus em favor do banqueiro Daniel Dantas, o desembargador Adilson Macabu também fez referência ao princípio da verdade real. Para o relator do caso, a busca da verdade real deve ser feita com observação da legalidade dos métodos empregados, respeitando-se o devido processo legal (HC 149250). 

Taxa para se defender A ministra Maria Thereza de Assis Moura invocou o princípio para afastar a necessidade de pagamento de despesas com oficial de Justiça para que fosse ouvida testemunha de defesa. O magistrado havia considerado a prova preclusa pela falta do pagamento da diligência. 

A relatora do HC 125.883 considerou que, mesmo em casos de ação penal privada, quando é exigido de forma expressa o pagamento da diligência, o juiz pode determinar de ofício a oitiva de testemunhas e outras diligências, “em homenagem aos princípios da ampla defesa e da verdade real, que regem o direito penal e o processo penal”. 

“Tal circunstância corrobora a ilegalidade aqui constatada, em que se deixou de ouvir testemunha regularmente intimada pela defesa, em ação penal pública, em decorrência do não recolhimento antecipado da taxa respectiva”, concluiu. 

Forma sem fim 
O princípio também serviu para afastar a incidência da súmula do STJ que exige a reiteração do recurso especial após o julgamento dos embargos de declaração. No caso, após os primeiros embargos terem sido julgados parcialmente a favor do recorrente, um dos corréus, não beneficiado, embargou novamente a decisão (Ag 1.203.775). 

Antes desse julgamento, porém, o recorrente apresentou recurso especial. Julgados e rejeitados os segundos embargos do corréu, ele não reiterou suas razões recursais, levando inicialmente à negativa de apreciação de seu apelo. 

No entanto, a Quinta Turma do STJ reviu sua decisão inicial em vista do princípio da verdade real. Para o ministro Jorge Mussi, “exigir-se tal ratificação, após julgamento de embargos de declaração rejeitados pela corte local, em que não houve modificação de absolutamente nada na situação jurídica dos sentenciados, afigura-se um excesso de formalismo, à luz dos princípios da celeridade processual e instrumentalidade das formas, principalmente no âmbito do direito processual penal, onde se busca a maior aproximação possível com a verdade dos fatos (verdade real) e o máximo de efetivação da Justiça social”. 

Segundo o relator, não haveria por que insistir na reiteração do recurso se não houve acréscimo, modificação ou supressão de questão de direito ou fato capaz de influenciar no recurso especial, de modo que não se poderia “exigir o preenchimento de uma formalidade sem qualquer fim específico”. 

A ministra Nancy Andrighi, em voto no REsp 331.550, manifestou-se pela prevalência da busca da verdade real sobre o formalismo processual: “Antes do compromisso com a lei, o magistrado tem um compromisso com a justiça e com o alcance da função social do processo, para que este não se torne um instrumento de restrita observância da forma, distanciando-se da necessária busca pela verdade real.” 

Ela também afirmou, no REsp 1.012.306, que “a iniciativa probatória do magistrado, em busca da verdade real, com realização de prova de ofício, é amplíssima, porque é feita no interesse público de efetividade da justiça”. Por isso, o juiz pode ter a iniciativa de exigir a produção de provas que entender cabíveis, mesmo que não solicitadas pelas partes. 

Direito civil 
O princípio da verdade real é menos presente, ou determinante, nos processos cíveis. Já dizia o ministro Vicente Cernicchiaro, em 1991: “O processo penal, ao contrário do processo civil, não transige com o princípio da verdade real” (RHC 1.330). 

É o que se extrai do voto do ministro Napoleão Nunes Maia Filho: “A relativa independência entre o orbe civil e o penal não se presta a justificar a possibilidade de duas verdades conflitantes protegidas pelo universo jurídico. A finalidade precípua da autonomia é permitir ao juízo penal perscrutar a verdade real além dos limites dentro dos quais se satisfaria o juízo civil.” (HC 125853) 

Na mesma linha o ministro Mauro Campbell Marques, ao considerar o dolo do agente em ação de improbidade administrativa: “A prova do móvel do agente pode se tornar impossível se se impuser que o dolo seja demonstrado de forma inafastável, extreme de dúvidas. Pelas limitações de tempo e de procedimento mesmo, inerentes ao direito processual, não é factível exigir do Ministério Público e da magistratura uma demonstração cabal, definitiva, mais-que-contundente de dolo, porque isto seria impor ao processo civil algo que ele não pode alcançar: a verdade real.” (REsp 1.245.765) 

Em 1990, o ministro Sálvio de Figueiredo já afastava o princípio em certos casos: “Na fase atual da evolução do direito de família, é injustificável o fetichismo de normas ultrapassadas em detrimento da verdade real, sobretudo quando em prejuízo de legítimos interesses de menor” (REsp 4987). 

Em matéria tributária, o princípio também é observado: “Caso os documentos colhidos pela fiscalização sejam suficientes para a verificação do lucro real, é com base neste que deverá ser efetuada a autuação, tendo em vista o princípio da verdade real na tributação”, afirma o ministro Campbell no REsp 1.089.482. 

Registro civil 
Assim, o princípio se aplica aos registros civis. É ele que garante a alteração dos nomes dos genitores no registros de nascimento dos filhos após o divórcio. “O princípio da verdade real norteia o registro público e tem por finalidade a segurança jurídica. Por isso que necessita espelhar a verdade existente e atual e não apenas aquela que passou”, afirma voto do ministro Luis Felipe Salomão (REsp 1.123.141). 

É da ministra Nancy a afirmação de que “não pode prevalecer a verdade fictícia quando maculada pela verdade real e incontestável, calcada em prova de robusta certeza, como o é o exame genético pelo método DNA”. O caso tratava de tentativa de alterar o registro de paternidade procedido pelo marido que fora induzido a erro pela esposa (REsp 878.954).


Boa Semana!

Profª Roberta